Regras, princípios e operações na reflexão bioética de Gustavo Bueno
Resumo
O presente trabalho se refere a uma parte de projeto de pesquisa desenvolvido com o objetivo de discutir e revisar os principais pressupostos conceituais da Bioética a partir da perspectiva do materialismo filosófico. No contexto desta investigação se examina a reflexão teórica do filósofo espanhol contemporâneo Gustavo Bueno, o qual propõe uma aproximação materialista dos problemas e categorias mais centrais do debate e das elaborações bioéticas. Com vistas à efetivação desta propositura, o intelectual espanhol identifica como
tarefa necessária o exame do estatuto racional da relação entre princípios e regras morais que servem de parâmetros de deliberação e ajuizamento de posições e ações no terreno abrangido pela bioética. Por
conseguinte, Bueno visa reformular o modo como tradicionalmente é entendida aquela relação. Ora colocada sob a égide de uma lógica dedutiva de talhe especulativo, na qual as regras seriam puras derivações ou casos de uma universalidade abstrata, ora concebida num registro imediatamente pragmático ou indutivo, inevitavelmente
casuístico, a conexão entre princípios e regras quase nunca aparece remetida, segundo o autor, ao nível da efetividade das relações nas quais os sujeitos são convocados a escolher e julgar entre alternativas. Neste sentido, tanto o metro quanto o objeto de avaliação, as opções de decisão que se referem diretamente à continuidade ou não de formas sociais de viver, e no limite de existir, deveriam ser determinados tendo por parâmetro o contexto no qual se forma e se insere a pessoa como ente de relações e interatuações recíprocas. Aqui, a vigência da regra
de ação pode muito bem retroagir sobre o princípio e motivar sua reconfiguração crítica. O que dá azo à reelaboração também de diversas outras categorias da reflexão ética, como a de autodeterminação, exempi
gratia, que não pode mais ser pensadas dentro dos cânones kantianos. A pessoa, definida por ele como sujeito operatório, necessariamente se diz no conceito de sua atuação frente ao conjunto da sociabilidade. A
pessoalidade em sua esfera de autodelimitação é concebida como uma atualidade ativa que se determina a partir do seu remetimento necessário à esfera de atuação dos demais sujeitos incluídos no circuito das relações sociais. A série de posições atualizáveis não o são mais como dedução de princípios primeiros irrevogáveis in absoluto,
mas de normas processuais generalizáveis reflexivamente a partir dos contextos problemáticos nos quais as deliberações acerca de vida e morte são requeridos.
Palavras-Chave: Bioética; Materialismo; Gustavo Bueno; Regras; Princípios.